Há dez anos, no dia 11 de março de 2004, uma série de atentados terroristas vitimaram 191 pessoas – e causaram mais de mil feridos – em Madrid. Um ano depois daquela triste data, um grupo de artistas de várias partes do mundo publicou o disco No os olvidamos, uma homenagem às vítimas daqueles atentados. José Saramago foi convidado para escrever um texto que acompanharia o disco. Disse que sim, e preparou as emotivas palavras transcritas abaixo:
“O rosto de um povo ferido” (José Saramago)
Em Espanha, solidarizar-se é um verbo que todos os dias se conjuga nos seus três tempos: presente, passado e futuro. A lembrança da solidariedade passada reforça a solidariedade de que o presente necessita, e ambas, juntas, preparam o caminho para que a solidariedade, no futuro, volte a manifestar-se em toda sua grandeza. O dia 11 de março não foi só um dia de dor e de lágrimas, foi também um dia em que o espírito solidário do povo espanhol ascendeu ao sublime com uma dignidade que me tocou profundamente e que ainda hoje me emociona quando o recordo. O belo não é só uma categoria do estético, podemos encontrá-lo também na ação moral. Por isso digo que poucas vezes, em qualquer lugar do mundo, o rosto de um povo ferido pela tragédia terá alcançado tanta beleza.