Os Poemas Possíveis

No fundo, eu não deixei de ser poeta, mas um poeta que se exprime através da prosa e provavelmente – e esta é uma ideia lisonjeira que eu quero ter de mim mesmo – é possível que eu seja hoje mais e melhor poeta do que quando escrevia poesia
José Saramago
Portugal

2014 (1ª edição na Porto Editora; 8ª edição); 2019, 11ª ed.
Idioma
Português
A caligrafia da capa é da autoria do escritor Almeida Faria
«Este mundo não presta, venha outro. / Já por tempo de mais aqui andamos / A fingir de razões suficientes. / Sejamos cães do cão: sabemos tudo / De morder os mais fracos se mandamos, / E de lamber as mãos, se dependentes.»
Na primeira obra poética de José Saramago descobre-se uma poesia de liberdade, de fraternidade e de luta. Uma luta disfarçada, por dentro das palavras. Pelo interior labiríntico de respiração que habitam todos estes poemas, publicados pela primeira vez em 1966. Digamos que eram os «poemas possíveis» da altura, quando a censura espiava a alma dos escritores. E no entanto, as convicções profundas de Saramago já são bem visíveis em poemas como «Criação»: «Deus não existe ainda, nem sei quando / Sequer o esboço, a cor se afirmará / No desenho confuso da passagem / De gerações inúmeras nesta esfera. / Nenhum gesto se perde, nenhum traço, / Que o sentido da vida é este só: / Fazer da Terra um Deus que nos mereça, / E dar ao Universo o Deus que espera.»
Diário de Notícias, 9 de outubro de 1998